Refúgio #12 | Os medos
O que aprendi ao longo desses anos é que o medo não deve ser negado ou minimizado. Ele precisa ser acolhido.
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Há uma fase, lá pelos oito ou dez anos, em que o mundo da criança começa a parecer grande demais. Os medos, antes simples e até fofinhos, o escuro, o barulho de trovão, o monstro imaginário no armário, ganham novas formas.
Agora, os medos vêm como dúvidas sobre ser aceito pelos colegas, temores sobre o futuro ou sobre não ser bom o suficiente. E é aí que os pais entram em cena, desempenhando um papel crucial na forma como essas crianças aprendem a lidar com o medo.
Há algo de desarmante no olhar de uma criança que está com medo. Não importa a idade, o medo paralisa e, muitas vezes, parece tomar proporções maiores que a realidade.
Como mãe, você já deve ter sentido o coração apertado diante de um filho que não consegue dormir porque tem medo do escuro, ou que hesita em entrar na escola porque teme não ser aceito.
Esses medos são comuns e, em certa medida, fazem parte do desenvolvimento. Mas e quando o medo se transforma em uma sombra constante, que limita não apenas a vida da criança, mas de toda a família?
Foi esse sentimento que tomou Clara* um dia ao observar sua filha, hesitando em ir à aula de balé. Não era preguiça, nem capricho: era medo. Medo de errar, de ser observada, de ser julgada. Aos 10 anos, ela já começava a viver as inseguranças que muitos de nós levamos para a vida adulta. Foi então que Clara se lembrou de uma cena de anos atrás, quando a filha era pequena.
*Clara e a história são fictícias.
A memória da filha e o escuro
Era uma noite particularmente longa quando a garota tinha uns quatro anos. Ela estava convencida de que havia "alguma coisa" no armário. Era o mesmo armário de sempre, o mesmo quarto, a mesma cama. Mas naquela noite, o medo ganhou forma. Clara sentou-se ao lado da filha, respirou fundo e, em vez de dizer “não há nada aí”, perguntou:
— O que você acha que está no armário?
Ela, com os olhos arregalados, respondeu baixinho:
— Um monstro.
Era fácil negar, abrir a porta, mostrar o vazio. Mas, naquele momento, ela percebeu que o medo da filha era real, ainda que o monstro não fosse. Então, foram juntas “investigar”. Pegaram uma lanterna, abriram o armário e iluminaram cada canto. Depois, criaram uma história: e se o monstro, na verdade, estivesse perdido? E se precisasse de ajuda para encontrar a saída? A filha deu risada, e o medo diminuiu.
Precisa de apoio para enfrentar os desafios da maternidade com mais calma e compaixão? Vamos conversar! Estou aqui para ouvir e ajudar você a encontrar equilíbrio e conexão no seu dia a dia.
Essa lembrança voltou à mente da mãe anos depois, quando percebeu que, mesmo mais velha, a filha ainda carregava medos — agora mais sutis e menos visíveis, mas igualmente poderosos.
A infância e a adolescência: fases de transição e medo
O medo é uma emoção natural, que surge em momentos de transição. Na infância, ele pode vir em formas simples, como o escuro ou a separação dos pais. Na adolescência, ele se transforma, ganhando contornos mais complexos: o medo de falhar, de não pertencer, de ser insuficiente, de situações sociais, doenças. É nesse momento que nossa presença como mães e pais faz toda a diferença.
Na adolescência, especialmente, as meninas têm o dobro de chances de apresentar transtornos de ansiedade em comparação aos meninos. Isso pode estar relacionado a fatores biológicos, sociais e culturais, que muitas vezes intensificam as pressões enfrentadas por elas.
O que aprendi ao longo desses anos é que o medo não deve ser negado ou minimizado. Ele precisa ser acolhido. Quando negamos o medo das crianças, enviamos uma mensagem de que elas estão erradas por senti-lo. Quando acolhemos, criamos espaço para que elas aprendam a enfrentá-lo, pouco a pouco.
Educação respeitosa e pitadas de budismo
Um ensinamento budista que carrego comigo é o de que o sofrimento nasce da resistência. Ao tentar evitar ou ignorar os medos de nossos filhos, acabamos alimentando-os. Mas, ao enfrentá-los com calma e compaixão, permitimos que eles diminuam.
Educar com respeito significa ouvir, observar e não julgar. Quando uma criança expressa medo, ao invés de dizer “não precisa ter medo”, podemos dizer:
— Eu entendo que você está com medo. Como posso ajudar?
Essa abordagem mostra que o sentimento dela é válido, mas que ela não está sozinha para lidar com ele.
Uma história para refletir
Certa vez, assisti a uma entrevista com um artista de circo. Ele dizia que, mesmo depois de anos de prática, ainda sentia medo antes de cada apresentação. “O medo não me paralisa”, ele disse. “Ele me mantém alerta, atento aos movimentos, me ajuda a estar presente.”
Pensei em como isso é verdade para os nossos filhos. O medo pode ser transformado em um aliado, algo que os ajuda a crescer. Para isso, precisamos ser como a rede de segurança de um trapezista: firmes, mas discretos, permitindo que eles voem e experimentem por si mesmos.
Se você quer se aprofundar nesse assunto, recomendo o livro Crianças Ansiosas: Um guia para entender e apoiar filhos que sofrem com ansiedade, de Reid Wilson e Lynn Lyons. Ele oferece estratégias práticas para pais ajudarem crianças a lidar com medos e preocupações, baseando-se em terapia cognitivo-comportamental. É uma leitura acessível e repleta de exemplos aplicáveis no dia a dia.
Ao final do dia, o que importa é que nossos filhos saibam que estamos com eles, seja para enfrentar monstros imaginários no armário ou para encarar os desafios reais da vida. Juntos, com paciência e amor, podemos mostrar que o medo pode ser enfrentado e superado.
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Publico mensalmente uma coluna muito especial em Vida Simples e tenho muitos artigos também publicados no caderno da Mariana Kotscho e Papo de Mãe no UOL, desenvolvi um podcast independente para centenas de ouvintes e construí essa newsletter no Substack, pela qual tenho prosperado nesses últimos dois anos graças a vocês leitoras.
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